Para tu existir, precisou existir eu.
Há quem diga que eu sou uma versão inédita de um acontecimento do passado. É que eu me vivo em atraso, e agora que os homens puderam me perceber. A gente se vive dentro de si e nem sabe como, muitas vezes se é desconhecido.
Eu nasci no carnaval, em Recife, Olinda. Já sabido de si, dono da própria liberdade, já me colocava a falar. Aprendo todo dia uma palavra nova para usar. Vim ao mundo com uma caneta nas mãos, cinco dedos. Levou um ano até que fosse eu ali, naquele canto, me conjugando num papel qualquer. Se entendido mas sem saber se algum dia me entenderiam.
Meu endereço nuca mudou. Vivo no verbo ser, onze, onde se guardam todas minhas memórias, que asfalto nenhum conseguiu apagar. Saio, paro, pergunto, rejeito, calo, penso, respiro, bebo, amo e concluo que existo. Os dias jamais foram os mesmos, porque existo.
Vivo em primeira pessoa, sou Eu, tentando me entender em um texto, quando as vezes nem eu mesmo sei quem sou. Faço caminhos, refaço história, crio personagens, dou fim a amores e me acho no meio de um texto qualquer. Aos poucos eu me escrevo e começo a ser, sou feito de palavras.
Há monstros a solta, eu vos criei, verdades que jamais serão ditas, versões de mim, que não dizem mais respeito a quem sou hoje. A gente muda e esquece de avisar. Provo de tu, em pensamento, revivo ele dentro de mim, imagino eles, refaço vos e crio nós. Tu já existe, pois eu te fiz, fostes o primeiro, Virgem.
Sou pouco, mas ainda sim, sou. Na possibilidade de tender a nada, posso ser tudo, então menino, cuidado, porque ainda não descobrir meu lugar no mundo, não sei bem quem serei, e isso também me assusta. O medo me sustenta, evita que eu caia em tentação e me conjugue em tempos errados, que eu cometa os mesmos erros do passado.
Em silêncio me farei, sem deixar rastros. Quando tu menos imaginar eu já nem estarei mais aqui. Sereis tu, estarei em ti.
De manhã, me banho no sol, em orbita alta o pensamento queima, analisa situações, te faz em mim e esquece meu corpo no chão, para que a chuva caia e me leve. Sou água, que em profundidade te afogou quando tu se pôs a mergulhar em mim. Meus dias estão salvos em um papel, eu vos dou a salvação, ainda que eu não esteja salvo.
Sei bem escolher meus inimigos, criar meu próprios monstros e como liberta-los. Já caí numa ciranda uma vez, rodei, dancei e o vento me levou, era Recife, o resto foi carnaval. Restos de mim que ficaram pelas ladeiras. Forte, sobrevivi aos meus piores dias, estranho. Estou vivo!
Vivo entre livros, monstros, fantasmas e poeira que cai em mim toda vez que me deito. Eu, estando face a face com o passado me faço na esperança de mudar o futuro. É sobre mim, é a mim que o cursor chama, ele grita a cada pulsar, ei!
Sobre mim, grita meu nome. Cristyam, sou Eu.